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Reforma sem maluquices

Num país beirando os 14 milhões de desempregados, os trabalhadores não podem mais pagar a conta da crise (Paulo Rossi)

Millôr Fernandes tem uma frase fantástica que resume muito bem a nossa situação: ”O Brasil tem um grande passado pela frente”. E tem mesmo! Estamos na Quarta Revolução Industrial, dominada pelas redes sociais, enquanto a nossa legislação trabalhista é de 1943. É claro que precisamos mudar e nos adaptar aos novos tempos. Mas a reforma trabalhista pretendida pelo governo Temer e por seus aliados não pode ser feita com maluquices. E nem açodada.

A primeira maluquice está no relatório elaborado pelo deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), uma mistura de reforma trabalhista com sindical, podendo prejudicar, e muito, a representatividade dos trabalhadores. Ou até acabar com ela. O relator, num ato de generosidade com os patrões, propõe que eles elejam os representantes dos empregados em sua empresa, em vez de esse papel ser exercido pelo sindicato laboral.

Uma proposta antidemocrática, com a finalidade de atender apenas aos interesses da classe patronal, estimulando que os empregadores forcem seus empregados a elegerem quem eles determinarem. Além de ferir o princípio da isonomia, joga por água abaixo o principal foco da reforma trabalhista, a prevalência do negociado sobre o legislado.

O relator equivocadamente tenta comparar nossa legislação trabalhista com países culturalmente diferentes

Outro ponto fundamental da CLT modificado por Marinho é o que determinava que as rescisões de contrato somente teriam validade quando homologadas pelo sindicato ou pelas Superintendências Regionais do Ministério do Trabalho ou, na ausência destes, por um juiz de paz.

O relator simplesmente desobriga as empresas a proceder desta forma, estimulando que ofereçam o que quiserem no ato da demissão; caso o empregado não concorde, terá de se submeter a um acordo extrajudicial ou entrar na Justiça. Qualquer das hipóteses poderá levar anos, fazendo com que o trabalhador aceite o valor que lhe for ofertado. Um verdadeiro retrocesso.

Outro ponto contra os trabalhadores foi a inclusão do trabalho intermitente de forma irrestrita, sem definir quais segmentos poderão utilizá-lo e sem prazo de validade. Isso estimulará os empregadores, no decorrer do tempo, a substituírem a troca de seus empregados que prestam serviços em regime regular (até 44 horas semanais) pelas horas efetivamente trabalhadas (intermitentes).

O relator equivocadamente tenta comparar nossa legislação trabalhista com países culturalmente diferentes, como Estados Unidos e Japão. Mas nos Estados Unidos a desigualdade somente aumentou com esse regime, pois quem executa o trabalho intermitente por lá, na maioria das vezes, são os imigrantes, principalmente os ilegais; os norte-americanos rejeitam esse tipo de trabalho devido à baixa remuneração sem vínculo funcional integral.

Quanto ao Japão, que tal copiar a prática na qual o maior salário de determinado empregado de uma empresa não pode ultrapassar em dez vezes o menor salário?

O Banco Mundial desmente a alegação de que a reforma trabalhista irá gerar mais empregos. Em um dos pontos de seu relatório, a instituição conclui que políticas e instituições trabalhistas não são o principal obstáculo e nem a “pílula mágica” para gerar empregos e desenvolvimento. O que gera empregos são investimentos, principalmente em infraestrutura, algo que não vemos no Brasil.

Num país beirando os 14 milhões de desempregados, os trabalhadores não podem mais pagar a conta da crise. Nós, trabalhadores, não aceitaremos reformas com viés autoritário ou que fragilizem a representatividade dos sindicatos e sua capacidade de lutar por uma sociedade mais justa e inclusiva.

Paulo Rossi é presidente da seção Paraná da União Geral dos Trabalhadores (UGT).  Gazeta do Povo

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